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quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Utilidades históricas - A Revoada dos Galinhas-Verdes



Por Guilherme Wagner, no Centro do Socialismo 



 Relembrar os fatos históricos é uma ação vanguardista. É nesse pensamento que relembremos o dia em que a esquerda paulista se uniu para massacrar e afugentar o movimento fascista-nazista brasileiro conhecido como Integralismo, tal massacre desmobilizou a Ação Integralista Brasileira [no estado de São Paulo, temporariamente - NOTA DO ÍNDIOS DAQUI].

Antes de lidarmos com o assunto em questão vamos analisar um pouco a conjuntura de mobilização do nazismo alemão: baseados em um nacional-socialismo os nazistas antes de qualquer ação de massas ou mudanças bruscas na sociedade convocavam todos os seus militantes para tomarem as ruas da cidade, criando assim um receio de qualquer manifestação contrária as suas perspectivas. Essa é mais uma evidencia de como o Integralismo Brasileiro é fascista, pois sua organização de massas se desenvolveu nos anos 1930/40 da mesma forma, onde se convocavam enormes manifestações integralistas para tomarem as ruas das principais cidades do país, instigando assim uma força enorme para um movimento integralista nacional através do medo e da coerção social (o que de fato foi o movimento nazista alemão).

É assim que para o dia 7 de outubro de 1934 a Ação Integralista Brasileira organiza uma manifestação com quatro mil militantes ou mais na Praça da Sé em São Paulo, seria então um comício de força para sua mobilização nacional. Sabendo de tal movimento a esquerda paulista resolve se organizar fazendo um contra-comício ou contra-ação integralista. O principal mentor de tal ação fora o anarquista Edgard Leuenroth (estimado anarquista que marcou a história brasileira, principal ícone quando se fala da história operária brasileira dos anos 1900/30), no entanto tal ação nem de perto foi somente anarquista. O fascismo que atormentava e se fortificava na nação brasileira precisava ser detido e somente uma ação destacada de toda a esquerda poderia impedir a extrema-direita brasileira. É por tais motivos que anarquistas, comunistas, trotskistas e sindicalistas se uniram para o combate. Há quem diga que tal combate foi em maioria de comunistas ligados ao PCB, no entanto essa informação é há muito dita como falsa, pois o PCB não chegava a 1000 filiados nesse período. Importante ressaltar que mesmo com a “dicotomia” internacional de trotskistas versusrussos stalinistas (que se acirrou com a expulsão de Trotsky do partido em 1927) tais correntes combateram lado a lado, isto é, contra as ações massacrantes da direita a população combativa tende a se unir.

Ao início da manifestação os integralistas enviaram mulheres e crianças a frente com bandeiras e suas camisas verdes, a primeira vez que usavam tais camisas, deixando o grande número de manifestantes, homens, virem por último. Logo no início houve um confronto de palavras entre comunistas e integralistas apaziguado pela Guarda-Civil, pois como era uma mobilização agendada e com apoio militar haveria segurança policial no local. Nesse embate entre comunistas e integralistas foram feitos disparos contra a guarda-civil, momento em que se faziam as duas primeiras mortes. Integralistas acusam comunistas de tal ação, assim como comunistas aos integralistas, mas a verdade é que os disparos saíam de locais estratégicos e atingiram tanto integralistas como comunistas. As declarações mais imparciais de tal mobilização dizem que não haviam armas de fogo entre os manifestantes, o que leva ao questionamento, de onde vinham os disparos? – Lembre-se que o integralismo assim como o comunismo na instituição do Estado Novo de Vargas (1937) foram duramente perseguidos, há de ser ver então a quem interessava esse conflito armado.

No entanto, não foi ali que iniciaram os combates mais incisivos. Dez minutos após os primeiros disparos chegava a Catedral da Sé a grande massa integralista e se concentravam nas escadarias, nesse momento que as organizações de esquerda, que se concentravam no edifício Santa Helena onde era o Sindicato dos Trabalhadores, creditaram o início do contra-comício. Enquanto os integralistas soltavam “anauês” (uma espécie de Heil Hitler brasileiro) os antifascistas começavam seu discurso com Edgard: “Companheiros antifascistas, viemos à praça para não permitir que o fascismo tome conte da rua e dos nossos destinos…”, logo após essa fala teve início um intenso tiroteio que atingiam a todos os manifestantes.

Os comunistas acreditando que tais disparos vinham dos integralistas tomaram suas armas – como facões, paus, tacos – e com seus punhos partiram para uma ação antifascista de conflito. Veja que não existiam realmente armas entre os manifestantes, e aqueles os quais alguns testemunhos diziam terem visto com armas, anos depois confirmaram que haviam se enganado. Assim, enquanto todo o bloco da esquerda antifascista reagia aos disparos tomando suas armas, medievais comparadas as de fogo, os integralistas simplesmente se dispersaram.

Poucos integralistas tentaram resistir, ao menos risco fugiram. A fuga não foi organizada, segundo relatos, muito se assemelhava a um galinheiro sendo invadido por uma raposa onde cada galinha voava desesperadamente para um lado buscando uma forma de fugir. Assim também o foram os integralistas, que além de fugirem desesperadamente, abandonavam suas camisas verdes para não serem reconhecidos futuramente, devido a isso que esse confronto ficou conhecido como a Revoada dos Galinhas-Verdes.

Os antifascistas se mantiveram na luta e conhecidos da intelectualidade foram atingidos, como Mário Pedrosa que relata em cartas de forma interessante tal conflito:


“A 7 de outubro de 1934, com efeito, o povo em massa dos bairros proletários acorreu ao Largo da Sé armado de qualquer coisa (pau, faca, foice, espingarda, pistola) e dissolveu no peito (centenas de feridos, uma dezena de mortos dum lado e do outro, muitíssimas prisões) a parada dos galinhas-verdes que nunca mais desfilaram pelas ruas de São Paulo. [...] A 7 de outubro de 1934, essa frente única consegue mobilizar a massa trabalhadora de São Paulo para dissolver a parada militar da milícia integralista, milhares de homens uniformizados e armados, provenientes de todo o Brasil, no Largo da Sé. Desde esse dia, os integralistas nunca mais desfilaram pelas ruas de São Paulo. Deu-se verdadeiro choque armado, com uma debandada quase geral dos integralistas, que deixaram pelas calçadas suas camisas verdes. A jornada, porém, foi pesada para os dois lados, com várias mortes, centenas de feridos, e grande agitação. Na esquina da rua Barão de Paranapiacaba com o Largo da Sé, o fogo foi muito cerrado, vindo sobretudo de integralistas estendidos pelo centro da Praça, e atingiu muitos companheiros. Um deles, um bravo estudante antifascista, atravessado pelas costas por uma bala, caindo em meus braços, exclama com uma golfada de sangue pela boca: “Estou ferido!” e logo depois sou também alcançado. A diferença é que Décio Pinto morria pouco depois, e Mário Pedrosa, mais feliz, saiu-se com umas balas na região glútea.”


Assim, ao final fugiram todos por estarem sendo perseguidos pela polícia. Mário Pedrosa viu um estudante morrer em seus braços, enquanto o conflito teve entre 10 a 20 mortes, vários feridos e um intenso embate que derrocou com a fuga hilariante dos integralistas, que nunca mais colocaram os pés em São Paulo. Era a vitória da esquerda sobre o fascismo.

Tal manifestação e conflito que uniu a esquerda mostra claramente como situações pontuais e espontâneas em determinados momentos surgem e devem ser levadas “a cabo”. O rechaço ao fascismo como luta de conquista popular não foi obra de partidos, sindicatos ou ídolos, mas obra de um movimento esquerdista que se forjou em uma materialidade existente de forma espontânea. A construção de um movimento de forma espontânea deve ser por vezes analisado mais profundamente, antes de sair alarmando conceitos profanados sem reflexão. A revoada dos galinhas-verdes foi sem dúvida obra do povo lutador e de esquerda: sem líderes, sem autoridades, sem organização centralizada ou partidária, a esquerda destruiu o fascismo em São Paulo e impediu, sem exageros, que ele tomasse o país.

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