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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

O caráter dos chineses


Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo


A China desperta ao mesmo tempo muita curiosidade e controvérsias. É previsível, dada a velocidade com que a China caminha rumo à liderança mundial.

Para ajudar a criar uma opinião mais fundamentada para todos nós, vou traduzir aqui alguns trechos do capítulo de seu livro sobre a China em que o intelectual inglês Bertrand Russell dissertou sobre o “caráter dos chineses”. Russell viveu na China. Evidentemente suas palavras não devem ser tomadas como verdades definitivas. Mas há nelas, desde que a pessoa não as leia já movida por preconceitos, algo que ajuda a ver em meio às brumas.

Enumerarei algumas, traduzidas o mais fielmente possível:

1) Os chineses, mesmo aqueles que são vítimas de infortúnios evitáveis, reagem com indiferença. Esperam os problemas passarem como se fossem a efervescência de um refrigerante. Depois de algum tempo, ele se pergunta: “É sábio ficar sempre em guarda na expectativa de futuros desastres? Devemos gastar nosso tempo construindo uma mansão que não vamos poder aproveitar?”

2) Os chineses, ao contrário dos povos ocidentais, mantiveram a capacidade de ter um prazer civilizado. Cultivam o tempo livre e as risadas, assim como as discussões filosóficas. De todas as raças que conheci, os chineses são os que mais amam o riso. Eles acham diversão em tudo, e uma disputa pode ser sempre atenuada por uma piada.

3) Os chineses, das camadas mais altas às mais baixas, têm uma dignidade pacata que é imperturbável, e a qual não costuma ser destruída nem quando eles recebem uma educação européia. Não são enfáticos, nem individualmente e nem como nação. Seu orgulho é muito grande para a ênfase. Eles admitem a fraqueza militar da China, mas não julgam que a perícia em matar seja uma qualidade numa pessoa ou num país.

4) Todo mundo tem um rosto, mesmo o mendigo mais humilde. Você não deve impor humilhações a ele, ou transgredirá o código de comportamento chinês.

5) Nada impressiona mais um europeu num chinês do que a paciência. Eles pensam não em décadas, mas em séculos.

6) A China é muito menos uma entidade política do que uma civilização – a única que sobreviveu dos tempos antigos. Desde os dias de Confúcio, os impérios do Egito, da Babilônia, da Pérsia, da Macedônia e de Roma se foram. Mas a China persistiu numa contínua evolução. Houve influências externas – primeiro o budismo, e agora a ciência ocidental. Mas o budismo não tornou a China uma Índia e nem a ciência ocidental vai transformá-los em europeus.

7) O que é ruim no Ocidente – sua brutalidade, sua falta de descanso, sua presteza em oprimir os fracos, sua preocupação apenas com coisas materiais – os chineses não querem adotar. O que é bom, especialmente sua ciência, eles querem adotar.

8) Os chineses que se educaram no Ocidente sabem que um novo elemento é vital para dinamizar velhas tradições, e eles olham para nossa civilização em busca disso. Mas eles não querem construir uma civilização igual à nossa. E é precisamente aí que estão depositadas as melhores esperanças. Se eles não partirem para o militarismo, eles poderão criar uma nova civilização, melhor que qualquer uma que nós ocidentais fomos capazes de erguer.

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