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domingo, 4 de julho de 2010

Irã, Brasil retaliações e o que tudo isso significa para nós


Texto de Beto Almeida, originalmente aqui

Enquanto uma frota de 11 navios dos EUA e 3 submarinos nucleares de Israel dirige-se ao Golfo Pérsico, com a colaboração da camarilha de vassalos da Arábia Saudita e do Egito, para uma ameaça real e uma não descartada agressão militar ao Irã, anunciam-se retaliações contra interesses econômicos do Brasil por não concordar com as sanções impostas à nação persa. Diante do risco da incineração de um povo que não invadiu nenhum outro país ou sequer explora outras nações, vamos registrando aqui no Brasil a elevação de tom de algumas vozes que muito longe de clamar por uma solução pacífica, aproveita a situação de perigo, hoje encoberta pela fumaça futebolística da Copa, para condenar não as retaliações que o Brasil pode receber dos EUA, mas a política externa do Brasil por defender nossa soberania, bem como uma solução pacífica para impasses desta natureza.

Nas novas sanções adicionais que o presidente Obama anuncia contra o Irã, ficam claras as intenções de atingir vários outros países. Ou seja, que por detrás das medidas punitivas ao Irã há também o objetivo de promover guerra comercial para ampliar o controle econômico do mundo em mãos das grandes corporações transnacionais, controladoras do mando político nos EUA. Pelas sanções, os EUA não aceitarão, assim mesmo, de modo imperial, que o Brasil venda etanol para o Irã, já que o objetivo é realizar um estrangulamento econômico e energético daquela nação. Hoje o Brasil não vende etanol para o Irã, mas se pretendesse vender, aqueles que se arrogam campeões do livre comércio, não permitirão, está proibido!

Nota-se satisfação em alguns articulistas da imprensa sempre sintonizada com os poderes internacionais na maneira de tratar estas absurdas retaliações. Agora transformam-se soberania e defesa de princípios e de fundamentos pacifistas para a solução de impasses em irrealismo diplomático. Ou seja, culpa-se o Itamaraty por não se curvar à prepotência inadmissível da Casa Branca, ora ocupada pelo primeiro presidente descendente de africanos, mas, apesar da diferença da cor da pela, igualmente teleguiado pelos desígnios do Pentágono, pelo complexo militar-industrial, provavelmente a verdadeira presidência dos EUA.

Irrealismo diplomático versus realismo vassalo

Para criticar o Itamaraty e a política externa de Lula, estes porta-vozes informam, com satisfação, que empresários brasileiros ligados ao setor de defesa foram comunicados por fornecedores ou parceiros em uma grande feira internacional que seus governos “estavam reavaliando as licenças de exportação de componentes sensíveis para o Brasil”. De acordo com estas fontes, os motivos são “a posição do Brasil em apoio ao Programa Nuclear Iraniano e também dúvidas sobre a própria ação das políticas nucleares do Brasil”

Na realidade, o problema não é novo. Há um veto imperial histórico das grandes nações capitalistas que querem impedir que outras nações desenvolvam-se tecnologicamente, sobretudo quando são possuidoras de grandes riquezas minerais e energéticas, como o Irã e também como o Brasil. Não por acaso houve tantos golpes de estado na Bolívia até que um índio aymara, - ensandecido de realista dignidade e de soberania, como teria sido nosso Tiradentes - desse um basta à uma sangria secular. Para os vassalos que analisam os fenômenos políticos sob a ótica tacanha do irrealismo diplomático, mesmo depois de ter expulsado o embaixador dos EUA, a Bolívia de Evo Morales segue altiva, já sendo território livre do analfabetismo, tendo reduzido em 75 por cento o preço de gás de consumo para o consumo doméstico e tendo implantado uma renda de cidadania , tudo a partir da nacionalização corajosa e soberana de seus recursos energéticos.

Sempre houve retaliações

O Brasil também já foi alvo de várias pressões e sabotagens, muito antes de praticar este propalado “irrealismo diplomático”. Turbinas nucleares importadas por Vargas da Alemanha foram seqüestradas por militares dos EUA no porto de Hamburgo, em 1952, quando seriam embarcadas para o Brasil. Posteriormente, quando Geisel firmou convênio nuclear com a Alemanha, em 1975, estas mesmas vozes posicionaram-se, como sempre, ao lado dos EUA buscando impedir que o Brasil se nuclearizasse. A lógica deste setor de plantão é impedir que um país emergente atinja plenitude sócio-econômica. Querem que o Brasil não tenha capacidade militar, de preferência reduzindo drasticamente suas forças armadas, e, também, relegando-as à função de mera polícia de bairro. Não querem que o Brasil tenha indústria naval, nem produção de fertilizantes, o que o impedirá de ter , de fato, soberania alimentar. Este setor, que comemorou o suicídio de Vargas e depois tentou frivolamente demolir a Era Vargas desnacionalizando o que pudesse, continua de plantão.

Desarmamento unilateral

Outra prova disso é a entrevista do físico José Goldemberg, ex-ministro do governo Collor, concedida à Revista Época, cujo título intrigante, sobretudo pelo momento em que o Brasil é alvo de retaliações imperiais é “O Brasil quer a bomba atômica”. Tanto o professor como a revista são por demais conhecidos. Mas, cabe salientar a torcida que ele faz para que o Brasil assine o Aditivo ao Tratado de Não Proliferação , mesmo sabendo que isto não apenas permitira inspeções sem qualquer reserva em todas as nossas instalações de pesquisa, algo que, evidentemente, os EUA, por exemplo , jamais admitiriam. Mas, o professor quer que o Brasil se submeta inspeções sem limites. Inclusive sob o risco de perder controle sobre desenvolvimentos tecnológicos avançados e não alcançados, ainda, por outros países.

Além disso, a posição do professor expressa a consciência de que a assinatura do Aditivo do TNP implicaria na renúncia, pelo Brasil, do desenvolvimento do projeto do submarino nuclear. E o professor, como todos nós, sabe que há uma imensa riqueza petroleira submarina e que as grandes potências têm uma práxis histórica de ignorar soberanias e territorialidades. Mesmo assim ele não se constrange em revelar seus pensamentos. Por que as potências imperiais não tiveram coragem suficiente para , apesar de toda sabotagem, pressão e agressividade, impedir que a China se transformasse numa das grandes potências econômicas, sendo também uma potência espacial? Porque diferentemente do Brasil, as forças armadas da China são......armadas, O que ainda não se pode afirmar em relação à capacidade de defesa do Brasil, apesar de uma positiva inversão de rota nas políticas para o setor de defesa que ainda possui jipes e tanques utilizados na guerra da Coréia e nem pode sequer garantir o rancho para todos os recrutas.

O caso dos aviões tucanos

As retaliações contra o Brasil não surgem agora pela política atual do Itamaraty. Eles obedecem a lógica da dominação do mundo, que nunca foi um mundo para meigos. A diferença é que os que alardeiam ”irrealismo diplomático” praticaram, quando no governo, o mais vexatório realismo vassalo. Exemplo claríssimo desta disposição infinita para obedecer ordens externas: com a privatização-desnacionalização da Embraer permitiu-se que há alguns anos, antes da crise do Irã, o Brasil fosse proibido de vender 150 aviões Tucanos para a Venezuela, disposta a comprá-los. Diante do veto imperial, sob o argumento de que há nos computadores das aeronaves componentes de fabricação norte-americana, a Venezuela fez a compra na China. Com a queda nas encomendas, a Embraer colocou no olho da rua 4800 metalúrgicos. Mesmo havendo no Brasil um imenso potencial para o desenvolvimento da aviação regional. Eis o preço social de tal realismo vassalo. Retaliações não são de hoje. Indaguem-se quantas houve contra o Programa Espacial Brasileiro, para o país não consiga entrar no seleto clube das potências espaciais.

A função das TVs Públicas

O período eleitoral no Brasil coincide com o agravamento da crise mundial do capitalismo e de uma clara intenção das grandes potências de sair da crise pela vida da dinamização da indústria bélica. Isto merece todo o bom debate do mundo por parte dos meios de comunicação, mas o que se verifica, salvo honrosas exceções para uma informação mais eivada de espírito público, é uma campanha de demolição da política externa brasileira. E mesmo na TV Brasil a pluralidade de opiniões sobre este tema realmente explosivo é bastante precária, havendo na editoria internacional um mesmismo de já linha editorial que condena o Irã por não abrir mão de sua soberania. É um quase recado disfarçado para que o Brasil também devesse optar pelo realismo subalterno.

É urgente que este debate se aprofunde e se qualifique, até porque a agressão contra o Irã pode se materializar, dolorosamente. Já fizeram Hiroshima e Nagasaki! E, as retaliações contra o Brasil e outros emergentes, podem se agravar sim. Só há duas alternativas: uma, quase impublicável, da qual é partidário o professor, a de querer ver o Brasil curvar-se ante os ditames do império. A outra, irrecusável, fortalecer nossa capacidade de realizar políticas soberanas e independentes, a capacidade de estabelecer novas parcerias internacionais, baseadas na cooperação e na solidariedade. Mas, com base no realismo histórico, isto implica em ter capacidade de defesa, independência tecnológica e aprimoramento de nossa democracia, superando as enormes dívidas sociais e vulnerabilidades externas e ideológicas que ainda nos machucam como nação. Em razão disso, obviamente, a turma do mantra do “irrealismo histórico” e do desarmamento unilateral, vocalizada pelo citado professor, certamente não estará com a candidata Dilma Roussef. Ela já disse que prega a continuidade das políticas em curso e seu aprofundamento, além de referir-se a Lula como um continuador de Vargas.

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Reservas de gás natural do Irã e o verdadeiro interesse americano

by Finian Cunningham - Centre for Research on Globalization

O inicio das operações de exploração do campo de gás natural de South Pars, no Irã, da China National Petroleum Company (CNPC), programado para este mês, poderia ser tanto um indicador de tendencias mas deve ser visto como uma explicação de envolvimentos geopolíticos muito mais vastos.

Antes de mais nada, o projeto de US$ 5 bilhões – assinado no ano passado depois de anos de entraves por parte gigantes da energia ocidental como a Total Petroleum e Shell, sob a sombra das sanções dos EUA – revela o principal sistema arterial da futura oferta e procura mundial de energia.

Muitos críticos há muito suspeitam que a razão real para o envolvimento militar dos EUA e de outros países ocidentais no Iraque e no Afeganistão é controlar o corredor energético da Ásia Central. Até agora, o foco principal sempre parecia ser o petróleo. Um grande projeto de gasodutos do Mar Cáspio para o Mar Arábico através do Afeganistão e do Paquistão é a jóia da coroa por trás campanha militar aparentemente fútil dos EUA naqueles países.

Mas o que se vê na parceria CNPC-Irã é que o gás natural é principal objetivo e que será essencial para a economia do mundo, e especificamente o fluxo de duas vias deste combustível para o Leste e Oeste da Ásia Central rumo à Europa e à China.

Michael Economides, editor do Energy Tribune de Huston é um dos numerosos observadores da indústria que está convencido de que o gás natural ultrapassará o petróleo como a principal fonte primária de energia, não apenas nas próximas décadas como ao longo dos próximos vários séculos.

Ele destaca a recente previsão da International Energy Agency (IEA), com sede em Paris, que foi revisada dramaticamente em 100 % das suas estimativas das reservas globais de gás natural. Economides atribui este enorme aumento a rápidas melhorias tecnológicas em explorar campos de gás até então quase inacessíveis. Afirma que a IEA estima quantidades de gás natural para 300 anos de abastecimento da atual procura mundial. "Se alguém simplesmente fantasiar quaisquer contribuições futuras de ordens de grandeza dos maiores recursos na forma de hidrocarbonetos em forma de gás, é fácil ver como é quase certo que o gás natural evolua até ser o primeiro combustível da economia mundial", acrescenta.

A importância crescente do gás natural como fonte de energia tem sido firme e inexorável desde há muitos anos. Entre 1973 e 2007, a contribuição do petróleo para a oferta mundial de energia caiu de 46,1 por cento par 34,0 por cento, com o aumento da utilização de gás natural a colmatar aquele declínio, segundo a IEA. Outras fontes, tais como a Energy Information Administration (IEA), com sede nos EUA, prevêem que o consumo de gás natural triplicará entre 1980 e 2030, data em que mais provavelmente tornar-se-á a fonte de energia primária preferencial para as necessidades industriais e públicas.

Há razões sólidas para o gás natural (metano) estar a tornar-se o rei dos combustíveis fósseis. Em primeiro lugar, tem um poder calorífico muito maior do que o petróleo ou o carvão. Ou seja, mais calor produzido por unidade de combustível. Em segundo lugar, é o combustível mais limpo, pois emite 30 por cento menos CO2 (dióxido de carbono [NT]) em comparação com o petróleo em comparação com o petróleo e 45 % menos em comparação com o carvão. Em terceiro lugar, o gás é mais eficiente no transporte, tanto como matéria primária forma comprimida ao longo de gasodutos enterrados como combustível para veículos.

Todas as agências de energia reconhecem que as primeiras fontes do gás natural do futuro estão no Médio Oriente e na Eurásia, incluindo a Rússia. A EIA com sede nos EUA coloca as reservas de gás natural nestas regiões como nove a sete maiores do que aquelas no total da América do Norte – as quais são uma das principais fontes deste combustível.

E no Oriente Médio, o Irã é sem dúvida o principal detentor de reservas de gás. O seu campo de South Pars é o maior do mundo. Se convertido em barris de petróleo equivalentes, o South Pars do Irã tornaria diminutas as reservas do campo petrolífero de Ghawar, na Arábia Saudita. Este é o maior campo de petróleo do mundo e, desde que entrou em operação em 1948, Ghawar tem sido efetivamente o coração pulsante do mundo para o abastecimento de energia primária. Na era que se aproxima de domínio do gás natural sobre o petróleo, o Irã suplantará à Arábia Saudita da condição de principal fornecedor de energia do mundo.

Tanto a Europa como a China almejam as principais rotas tronco para o gás iraniano. A infraestrutura já está se moldando e reflete isso. O gasoduto chamado Nabucco está planejado para fornecer gás do Irã (e do Azerbaijão) via Turquia e Bulgária transportando-o para a Europa Ocidental (assinalando um fim ao domínio russo). O Irã também exporta gás via gasodutos diferentes para a Turquia e a Arménia e também deve procurar aumento de suas exportações para outros países do Golfo, incluindo os Emirados Árabes Unidos e Oman.

Outra rota estratégica é o chamado Gasoduto da Paz, do Irã para o Paquistão e a Índia, através do qual o Irã exportará este combustível para dois dos mais populosos países da região. Mas talvez a perspectiva mais irresistível para o Irã seja o gasoduto de 1.865 quilómetros que fornece gás natural do Turquemenistão através do Uzbequistão e do Cazaquistão para a China e que deve operar a plena capacidade em 2012. O Sul do Turquemenistão tem uma fronteira de 300 km com o Irã e já tem um acordo de exportação de gás com Teerã. Se o desenvolvimento do campo de gas iraniano-chinês de South Pars puder ser incorporado nos gasodutos transnacionais acima mencionados, isso confirmaria o Irã como o coração pulsante da economia mundial na qual o gás é a fonte de energia primária. Isto é potenciado ainda mais pela procura de gás da China, em crescimento rápido, a qual a EIA prevê que podia estar dependente de importações em mais de um terço do seu consumo de gás natural em 2030.

Neste contexto de um grande realinhamento da economia energética mundial – no qual haverá uma diminuição contínua do papel dos EUA – a retórica tonitruante de Washington acerca de democracia e paz e guerra ao terror ou alegadas armas nucleares iranianas pode ser vista como uma tentativa desesperada para esconder o seu medo de que esteja destinado a ser um grande perdedor. Cercar o Irã com guerras e ameaçar o fornecimento de gás para o provável maior futuro consumidor de gás – a China – é o assunto real. As ações norte americanas são vistas mais exctamente como o encostar de uma faca nas artérias energéticas de uma economia mundial que os EUA não são mais capazes de dominar.

Um novo aspecto desta história é a posição da Rússia. Com as suas próprias vastas reservas de gás natural, ela pode ser vista como um competidor do Irã. Comprovadamente menos bem posicionada do que o Irã para o fornecimento tanto à Europa como à China, a Rússia é no entanto um grande acto e tem estado insistentemente a cortejar a China com um acordo de exportação desde 2006. Contudo, como observa Economides, "as negociações entre os dois países tem sido intermitentes e, especialmente, a construção do gasoduto tem sido penosamente lenta".

Mas as ambições da Rússia em expandir as suas exportações de gás natural podem explicar porque ela tem mostrado ser um aliado caprichoso do Irã. A posição ambivalente de Moscou em relação a sanções norte americanas contra o Irã sugere que a Rússia tem a sua própria agenda destinada a embaraçar a república islâmica como um rival regional na energia.

Tradução henry Henkels

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